Abicalçados: suspensão da desoneração desrespeita trâmite democrático

Medida irá causar uma onda de desemprego na atividade, alerta entidade

 

“Uma decisão que desrespeita a vontade da sociedade e ilustra o crescimento do Custo Brasil”. É desta forma que a Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados) recebeu a notícia do último dia 25 de abril, quando o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Cristiano Zanin suspendeu a  desoneração da folha de pagamentos para os 17 setores que mais empregam no Brasil. A ação de inconstitucionalidade havia sido impetrada pela Advocacia Geral da União (AGU), em representação do Governo Federal, no último dia 24. 

O presidente-executivo da Abicalçados, Haroldo Ferreira, destaca que a medida é um retrocesso, já que a desoneração da folha de pagamentos já havia sido amplamente discutida - e aprovada - no Congresso Nacional, inclusive com parlamentares da base de apoio do Governo Federal. “É um balde de água fria para o setor calçadista, que recentemente reportou a criação de mais de 5 mil empregos no primeiro bimestre do ano, no que parecia ser o início de uma recuperação lenta e importante depois de um ano de 2023 de dificuldades”, comenta. Segundo o executivo, a decisão do STF ilustra o crescimento dos custos produtivos no Brasil. “O assunto estava pacificado após ampla mobilização e discussões no Congresso Nacional, mas infelizmente o Governo Federal não respeitou a vontade do parlamento. É uma medida que enfraquece a política e a própria democracia”, lamenta.

Segundo Ferreira, a partir de agora, a força tarefa dos 17 setores, dentro dos quais a Abicalçados está incluída, juntamente com o apoio do Congresso, será voltada para que o plenário do STF, que vai analisar a liminar, reverta a decisão e retome a desoneração e conserte um “equívoco grave”. “Demonstraremos que, em 2023, o projeto de lei de autoria do senador Efraim Filho (Projeto de Lei nº 334/23) teve longo e completo trâmite no Congresso Nacional, com debates e atuação de todo o espectro político, inclusive de integrantes da base do atual Governo. No trâmite, o debate incluiu preocupações orçamentárias, jurídicas e relativas ao mérito da política”, explica o dirigente, ressaltando que a entidade irá manter o diálogo com os Poderes da República para endereçar uma situação de “absoluta insegurança jurídica, econômica e social que irá gerar uma avalanche de desemprego”. 

Histórico de debates
Após intensas discussões, o projeto que prorroga a desoneração havia sido aprovado pelo Congresso Nacional ainda no ano passado. No entanto, mesmo após sua aprovação, enfrentou um veto da Presidência da República (Veto nº 38/2023), argumentando questões jurídicas previamente debatidas e superadas durante o processo legislativo, com base em análises das assessorias das Casas Legislativas e em uma decisão do ministro Ricardo Lewandowski, então membro do STF.  Diante do impacto social e econômico que a não prorrogação desta sistemática tributária poderia causar, o Congresso Nacional rejeitou o veto do Executivo, resultando na promulgação da Lei nº 14.784/2023, agora suspensa pelo ministro Zanin. 

Impacto da medida
Estudo divulgado pela Abicalçados aponta que o impacto da reoneração da folha de pagamentos para o setor irá reduzir a produção de calçados em mais de 20% (cerca de 150 milhões de pares a menos), o que terá reflexo na geração de empregos. É estimada pela entidade a demissão de aproximadamente 30 mil pessoas nos próximos dois anos de reoneração da folha. 

Entenda
A desoneração da folha de pagamento estava em vigor desde 2011 e beneficiava 17 setores da economia que mais empregam no País, entre eles o calçadista. Conforme o mecanismo, as empresas dos setores contemplados poderiam substituir o pagamento de 20% de contribuição previdenciária sobre os salários dos funcionários por uma alíquota que variava de 1% a 4,5% sobre a receita bruta - no caso do setor calçadista, o pagamento era de 1,5%.